O Mandamento Maior - Domingo 26/10/2008


O povo de Israel foi muito bem educado. Em comparação com outras religiões, a de Israel dá um peso notável à ética. A 1ª leitura de hoje mostra, por um texto antiqüíssimo, como o povo era constantemente convidado a julgar com delicadeza o que convinha no cotidiano. Não oprimir os estrangeiros e migrantes (prática comum daquele tempo, como hoje), pois também eles foram uma vez estrangeiros. Não explorar viúvas e órfãos. Não exigir juros sobre o dinheiro emprestado a um pobre (outra coisa é o dinheiro creditado a um rico para especular ... mas os nossos bancos e financiamentos não conhecem essa distinção). Quem recebe um manto em penhor, tem que devolve-lo antes da noite, para o coitado não passar a noite fria sem coberta. Diante de tal pedagogia divina, o salmista, no salmo responsorial, pode com justiça exclamar que Deus é sua defesa e salvação. Tal Deus merece ser amado!

Os escribas de Jerusalém, impressionados com a sabedoria de Jesus (cf. domingo passado), queriam saber como ele resumiria a Lei. Pois, no meio do legalismo farisaico, que multiplicava as regras e intepretações, alguns, como o liberal rabi Hilel, achavam que era preciso simplificar a Lei e procurar-lhe um princípio central, uma chave de interpretação. Tal chave de interpretação, revelando o espírito mais profundo da Lei, Jesus a encontra no mandamento que todos os judeus sabiam ser o primeiro (citado no “Shemá Israel”, Dt 6,4ss): amar a Deus acima de tudo. Mas, acrescenta Jesus, há um segundo, de igual peso: amar ao próximo. Nestes dois mandamentos, qual uma porta nos seus gonzos, repousa toda a Lei (evangelho).

Segundo os evangelhos sinóticos (Mt 22,34-40 e par.), Jesus situou o cerne da Lei (que quer ser a expressão da vontade de Deus) no amor a Deus e ao próximo. Paulo, Tiago e João só falam no mandamento do amor fraterno (cf. Rm 13,8-10; Gl 5,14; Tg 2,8; Jô 13,34 etc.). Essa diferença não é fundamental, pois não se consegue amar bem ao irmão se não ama a Deus, isto é, se não se procura conhecer sua vontade absoluta referente ao irmão. Pois quem não admite Deus em sua vida se coloca a si mesmo como Deus para os outros... Mesmo se não se confessa a fé em Deus com as palavras de nosso Credo, é preciso admitir alguma instância absoluta para amar ao irmão como convém e não conforme veleidades subjetivas. ( Há muitos que se amam a si mesmos no próximo: mães “corujas”, revolucionários ambiciosos, benfeitores espalhafatosos, apóstolos que procuram afirmação pessoal etc.)

Convém considerar também a unidade dos dois mandamentos pelo outro lado: não se pode amar a Deus sem amar o irmão (cf. 1Jo 4,20). Já no Antigo Testamento conhecemos Deus como protetor e defensor dos mais fracos. Como nos daríamos bem com ele, oprimindo nosso irmão?

Como poderíamos ser amigos do pai sem amarmos seus filhos? Quando os mensageiros anunciaram a Davi a “boa” notícia da morte de seu filho rebelde Absalão, ele o chorou, e a vitória se transformou em luto (2Sm 18-19). Se Deus é o defensor dos fracos, como poderão os cristãos apelar para o evangelho sem escolher o lado dos fracos e desprotegidos?

A 2ª leitura apresenta os tessalonicenses como exemplo de fé generosa, na perspectiva do novo encontro com o Senhor ressuscitado (v. 9-10). Este exemplo se transforma para nós em exortação, ao aproximar-se o fim do ano litúrgico, acentuando-se a perspectiva final. “Tornastes-vos imitadores nossos e do Senhor”. Quantos evangelizadores podem dizer, com a simplicidade de Paulo, que seus “evangelizadores” os imitem para serem imitadores do Senhor?

A oração do dia oferece um pensamento digno de meditação. “Daí-nos amar o que ordenais”. Geralmente, gostaríamos de que ele ordenasse o que amamos. Mas reconhecemos que seu critério é melhor que o nosso.

Do livro "Liturgia Dominical", de Johan Konings, SJ, Editora Vozes
(fonte: http://www.franciscanos.org.br/)