Reportagem sobre o dia de Santo Frei Galvão, no Valongo (Santos-SP-Brasil)

Clique abaixo para ver a reportagem do "Jornal da Tribuna - 1a. Edição", da TV Tribuna, sobre Santo Frei Galvão, no dia 25 de outubro de 2008.


O Mandamento Maior - Domingo 26/10/2008


O povo de Israel foi muito bem educado. Em comparação com outras religiões, a de Israel dá um peso notável à ética. A 1ª leitura de hoje mostra, por um texto antiqüíssimo, como o povo era constantemente convidado a julgar com delicadeza o que convinha no cotidiano. Não oprimir os estrangeiros e migrantes (prática comum daquele tempo, como hoje), pois também eles foram uma vez estrangeiros. Não explorar viúvas e órfãos. Não exigir juros sobre o dinheiro emprestado a um pobre (outra coisa é o dinheiro creditado a um rico para especular ... mas os nossos bancos e financiamentos não conhecem essa distinção). Quem recebe um manto em penhor, tem que devolve-lo antes da noite, para o coitado não passar a noite fria sem coberta. Diante de tal pedagogia divina, o salmista, no salmo responsorial, pode com justiça exclamar que Deus é sua defesa e salvação. Tal Deus merece ser amado!

Os escribas de Jerusalém, impressionados com a sabedoria de Jesus (cf. domingo passado), queriam saber como ele resumiria a Lei. Pois, no meio do legalismo farisaico, que multiplicava as regras e intepretações, alguns, como o liberal rabi Hilel, achavam que era preciso simplificar a Lei e procurar-lhe um princípio central, uma chave de interpretação. Tal chave de interpretação, revelando o espírito mais profundo da Lei, Jesus a encontra no mandamento que todos os judeus sabiam ser o primeiro (citado no “Shemá Israel”, Dt 6,4ss): amar a Deus acima de tudo. Mas, acrescenta Jesus, há um segundo, de igual peso: amar ao próximo. Nestes dois mandamentos, qual uma porta nos seus gonzos, repousa toda a Lei (evangelho).

Segundo os evangelhos sinóticos (Mt 22,34-40 e par.), Jesus situou o cerne da Lei (que quer ser a expressão da vontade de Deus) no amor a Deus e ao próximo. Paulo, Tiago e João só falam no mandamento do amor fraterno (cf. Rm 13,8-10; Gl 5,14; Tg 2,8; Jô 13,34 etc.). Essa diferença não é fundamental, pois não se consegue amar bem ao irmão se não ama a Deus, isto é, se não se procura conhecer sua vontade absoluta referente ao irmão. Pois quem não admite Deus em sua vida se coloca a si mesmo como Deus para os outros... Mesmo se não se confessa a fé em Deus com as palavras de nosso Credo, é preciso admitir alguma instância absoluta para amar ao irmão como convém e não conforme veleidades subjetivas. ( Há muitos que se amam a si mesmos no próximo: mães “corujas”, revolucionários ambiciosos, benfeitores espalhafatosos, apóstolos que procuram afirmação pessoal etc.)

Convém considerar também a unidade dos dois mandamentos pelo outro lado: não se pode amar a Deus sem amar o irmão (cf. 1Jo 4,20). Já no Antigo Testamento conhecemos Deus como protetor e defensor dos mais fracos. Como nos daríamos bem com ele, oprimindo nosso irmão?

Como poderíamos ser amigos do pai sem amarmos seus filhos? Quando os mensageiros anunciaram a Davi a “boa” notícia da morte de seu filho rebelde Absalão, ele o chorou, e a vitória se transformou em luto (2Sm 18-19). Se Deus é o defensor dos fracos, como poderão os cristãos apelar para o evangelho sem escolher o lado dos fracos e desprotegidos?

A 2ª leitura apresenta os tessalonicenses como exemplo de fé generosa, na perspectiva do novo encontro com o Senhor ressuscitado (v. 9-10). Este exemplo se transforma para nós em exortação, ao aproximar-se o fim do ano litúrgico, acentuando-se a perspectiva final. “Tornastes-vos imitadores nossos e do Senhor”. Quantos evangelizadores podem dizer, com a simplicidade de Paulo, que seus “evangelizadores” os imitem para serem imitadores do Senhor?

A oração do dia oferece um pensamento digno de meditação. “Daí-nos amar o que ordenais”. Geralmente, gostaríamos de que ele ordenasse o que amamos. Mas reconhecemos que seu critério é melhor que o nosso.

Do livro "Liturgia Dominical", de Johan Konings, SJ, Editora Vozes
(fonte: http://www.franciscanos.org.br/)

Buscando, com Maria, um outro mundo possível


Hoje fazemos memória da Páscoa de Jesus, celebrando Nossa Senhora Aparecida, que em 1930 foi proclamada, pelo Papa Pio XI, a padroeira do Brasil, “para promover o bem espiritual dos fiéis e aumentar cada vez mais a devoção à Imaculada Mãe de Deus”.

Sua imagem colhida por três pescadores, em outubro de 1717, quando lançavam suas redes no rio Paraná, é hoje venerada no Santuário Nacional em Aparecida do Norte por multidões de peregrinos e peregrinas de todas as partes do Brasil.

Toda liturgia de hoje é marcada pelo pedido de intercessão a Maria, padroeira de nossa Pátria, junto de Deus. Ao pedirmos bênçãos para a Pátria, nos dispomos também a sermos instrumentos daquilo que pedimos, no empenho incansável por uma Nação melhor, mais justa, mais fraterna e feliz, mais conforme o projeto de Jesus.

Lembremos também hoje todas as crianças, na comemoração de seu dia, e do início da resistência indígena na América Latina, com a chegada da expedição de Cristóvão Colombo.
Neste momento atual, no Brasil e no mundo afora se assiste atordoado o sobe e desce das bolsas de valores em todos os países, em especial, nos Estados Unidos e no velho continente. São números, alta do dólar, queda nas transações. Enfim, a bola da vez se chama "crise".

Mas o que seria essa crise? O sociólogo português Boaventura de Souza Santos chama-nos atenção para olharmos essa crise numa perspectiva da ampliação do Estado e, talvez, a minimização do mercado total.

Até pouco tempo atrás, o deus "mercado" evangelizava o mundo e as consciências afirmando as teses de Hayek e Friedman: "menos Estado, mais mercado". Agora, a crise do sistema financeiro derruba o dogma da imaculada concepção do livre mercado como única panacéia para o bom andamento da economia.

Tudo se resumia ao consumo que se tornava uma espécie de "prece" e ato religioso realizado pelo fiel ao deus mercado que tudo criava e recriava. Quem participava do mercado já se encontrava no paraíso, "onde corre leite e mel" das compras em shoppings ou em novas ágoras fast-food (Macdonald’s) onde somente os que podem pagar, podem comer o banquete sagrado e antinutritivo. Diante disso, não há necessidade de política, de participação, de Estado e, muito menos, se pensar no futuro da Casa Comum.

O evangelho de hoje também nos fala de uma crise durante uma festa de casamento. O vinho veio a faltar... Maria ocupa um lugar central na solução desta crise. Nela se manifesta o povo simples e pobre. Maria de Nazaré surge como intermediária entre a realidade dos pobres e Jesus como Messias.
Maria é a mãe que se põe a serviço do Reino. Maria é símbolo dessa humanidade que realiza o projeto de Deus e faz o “que Jesus mandou”.

O programa Bolsa Fartura de Bush reúne quantia suficiente para erradicar a fome no mundo. Mas quem se preocupa com os pobres? Devido ao aumento dos preços dos alimentos, nos últimos dozes meses o número de famintos crônicos subiu de 854 milhões para 950 milhões, segundo Jacques Diouf, diretor-geral da FAO.

Não se mede o fracasso do capitalismo por suas crises financeiras, e sim pela exclusão - de acesso a bens essenciais de consumo e direitos de cidadania, como alimentação, saúde e educação -, de 2/3 da humanidade. São 4 bilhões de pessoas que, segundo a ONU, vivem entre a miséria e a pobreza, com renda diária inferior a US$ 3.

Há, sim, que buscar com Maria, com urgência, um outro mundo possível, economicamente justo, politicamente democrático e ecologicamente sustentável.

O milagre depende de nós!

Lembrando Maria, Aparecida na rede de pobres pescadores e trazendo a cor negra, bendizemos o Senhor da Vida e sua predileção pelos pequenos e sofredores.

Unimos nossa voz ao clamor de todo o povo pobre, peregrino em busca de melhores condições de vida, força e alento para vencer suas dificuldades. Que o Senhor renove nosso desejo de optar sempre e, em primeiro lugar, pela vida.

Fazendo o que ele nos mandou, com Maria participamos do banquete da vida pela palavra e pela Eucaristia. Saboreamos do vinho novo que nos alegra, nos torna atentos às necessidades dos outros e nos encoraja na luta para que não falte a alegria na festa da vida, sobretudo para as crianças, os povos afro-descendentes e todos os carentes.

“Contemplando hoje Maria, Mãe do Senhor, primeira evangelizada e primeira evangelizadora, invocada no Brasil com o título de Aparecida, ícone da Igreja em missão, sejamos inspirados com seu exemplo de fidelidade e disponibilidade incondicional ao Reino de Deus” (Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora, n. 216). Que assim seja. Amém.
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Diácono Wolfgang Müller
Graduado em Teologia (fonte: www. homilia.com.br)

Fontes que ajudaram a escrever esta homilia:
• Crise do evangelho neoliberal, artigo de Claudemiro Godoy do Nascimento
• O abalo dos muros, artigo de Frei Betto
• Ele está no meio de nós, livrinho da CNBB, textos de Maria de Lourdes Zavarez e Maria do Carmo

A vinha de Deus

Um dos textos mais populares da literatura profética era o Cântico da Vinha, alegoria do profeta Isaías sobre a ingratidão da vinha escolhida por Deus, rodeada por ele com todos os cuidados possíveis e que, contudo, não produziu frutos. A vinha é Israel que, em vez de produzir a justiça - o bem que Deus deseja para todos -, institucionalizou o derramamento de sangue e a opressão.

Esta é a 1ª leitura de hoje. Faz pensar na América Latina: era um continente paradisíaco (até hoje alguma coisa disso sobrou); foi dado aos cristãos da Europa, incentivados por indulgências e privilégios pontifícios para “propagar a fé”... Mas o fruto foi a violência institucionalizada.

Se alguém achar essa exegese atualizada demais, olhemos para a exegese atualizada do Cântico da Vinha que Jesus propõe (evangelho). Jesus não acusa a vinha, como Isaías, mas aos agricultores. Se o “senhor da vinha” nunca viu os frutos, não é porque a vinha não os produzia, mas porque os arrendatários os desviavam...

Inclusive, maltratavam os emissários que o dono mandava (os profetas), e quando mandou seu próprio filho, o herdeiro, quiseram assegurar para si a herança da vinha, matando o herdeiro. Jesus, enviado junto ao povo de Israel para reclamar frutos de justiça, foi “jogado fora da vinha” (o Calvário, fora dos muros de Jerusalém) e morto.

O resultado foi que a vinha lhes foi tirada e confiada a quem entregasse a produção: os pagãos, que acolheram a pregação dos apóstolos antes dos judeus. E o texto acrescenta que isso realizou uma lógica que já estava nas Escrituras: a pedra jogada fora pelos construtores tornou-se pedra angular do edifício (SI 118 [117],22s). Esta é a lógica da morte e ressurreição de Jesus, na qual está fundado o novo povo de Deus (cf. At 2,33; 1Pd 2,7).

Assim, esta parábola contém duas lições:

1) Deus esperava justiça de Israel, mas precisou colocar novos administradores para colher o fruto de sua vinha. Ora, o “fruto de justiça” é a fé que atua na caridade, pois justiça é aquilo que é conforme à vontade de Deus, e esta é, antes de tudo, que escutemos Jesus e ponhamos em prática o que ele ensina (cf. Mt 17,5 e par.). O “fruto da justiça” inclui tudo o que a obediência à palavra de Cristo produz: amor sem fingimento, fraterna união, mútua doação etc.

2) A grandeza da obra de Deus: não há mal que por bem não venha. A rejeição de Cristo foi a prova da injustiça dos arrendatários, a abolição de seus privilégios, a transferência da vinha para os gentios que se converteram e produziram fruto: a Ressurreição do Cristo num povo novo.

Não leiamos esta parábola com olhos triunfalistas, considerando-nos os “bons”. A história se repete. A Nova Aliança, em que o antigo povo de Deus, ingrato, abre o lugar para o novo povo universal de Deus, é uma realidade escatológica, isto é, já iniciada, mas ainda não definitivamente estabelecida. Em outros termos, a qualquer momento podemos cair fora! Quando nos apropriamos dos frutos, fazendo do povo de Deus nosso negócio (pense na cristandade que sangrou a América Latina...), então, já não somos administradores da vinha. Para entender bem o evangelho de Mt, devemos sempre pensar que os fariseus somos nós mesmos! E seremos o novo povo de Deus, edificado no Cristo ressuscitado, apenas se entregarmos a Deus os frutos da justiça.

A 2ª leitura nos mostra o que são os frutos de justiça: tudo quanto for verdadeiro, nobre, reto, puro, amável, honrado, tudo o que for virtuoso e digno de louvor... Paulo não oferece um elenco de boas ações, de coisinhas para fazer. Ele tem confiança na consciência do bem que Deus nos deu. Sejamos gente, em nome de Cristo Jesus: então produziremos frutos de justiça! E o Deus da Paz (o dom messiânico por excelência) estará conosco.

A liturgia eucarística é marcada pela idéia da unidade de novo povo de Deus (sobretudo canto da comunhão, opção II). Na mesma linha, pode-se rezar o prefácio dos domingos do tempo comum VIII. A oração final expressa o fundamento desta trindade: a Eucaristia nos deve transformar naquele que recebemos. Recorrendo aos sinais eucarísticos, podemos dizer: somos o corpo de Cristo, a vinha do Pai.

Do livro "Liturgia Dominical", de Johan Konings, SJ, Editora Vozes

fonte: www.franciscanos.org.br