O Bom Pastor (4º Dom.Páscoa/2010)

Na primeira e na segunda parte da alegoria do Bom Pastor (cf. 4º dom. pascal A e B), aprendemos que o Bom Pastor "dá vida em abundância" (10,10) e, soberanamente, dá "sua vida" pelas ovelhas (Jo 10,11-18).

Já sabemos que se trata da vida divina. Hoje aparece o mistério de onde provém este dom: a união de Cristo com o Pai. Somos conduzidos à fonte da água da vida (cf. Ap 7,17), Deus mesmo (Jo 10,27-30).

Na atual composição do 4º evangelho, este trecho é separado dos anteriores por um novo cenário, a festa da Dedicação do Templo (Jo 10,22; a parte anterior situava-se na seqüência da festa dos Tabernáculos, iniciada em Jo 7). Este novo cenário indica um crescendo na impaciência dos judeus com relação ao messianismo de Jesus: "Se tu és o Cristo, dize-nos abertamente” (10,24).

Esta provocação suscita uma afirmação mais clara da unidade de Jesus e o Pai, a ponto de provocar uma acusação da blasfêmia e uma tentativa de apedrejamento (10,31). Contudo, o ser Messias de Jesus consiste, exatamente, em conduzir-nos à contemplação do Pai dele (14,9).

Ele nos dá uma vida que ninguém nos pode tirar, porque ele é um com o Pai. Se o seguirmos, estaremos na mão de Deus. Se nos solidarizarmos com ele - e esta é a "lição" de hoje - alcançaremos a fonte donde ele tira sua força, sua inabalável vida divina.

Somos convidados, hoje, a seguir o Cordeiro aonde ele for, solidários com ele na morte e na vida: então participaremos da vida da qual ele mesmo vive, a vida de Deus.

Devemos deixar-nos guiar por um Pastor que dá sua vida por nós, pois esta vida não é sua, mas a de Deus. Ora, em que consiste esta "condução"? "Quem quiser ser meu discípulo, assuma sua cruz e siga-me ... Quem perder sua vida, há de realizá-la ... Onde eu estiver, ali estará também meu servo ... " (10 12,23ss; Mc 8,34ss). Palavras paradoxais, que significam: a fonte da vida e da força de Jesus é o Deus-amor, o Deus da doação da vida.

Quem está bem instalado na sua igrejinha não gosta de ouvir tal mensagem. Esquiva-se, chamando-a de romantismo. Ou, se a gente insiste, diz que é desordem e subversão ... Assim aconteceu com Paulo e Barnabé, quando foram pregar para os judeus de Antioquia da Pisídia (na Turquia). O resultado foi muito bom para os pagãos, pois rejeitados pelos judeus, Paulo e Barnabé se dirigiram a eles (1ª leitura).

Não falta atualidade a esta história. No momento em que a Igreja latino-americana toma consciência da inviabilidade de uma cristandade cúmplice de injustiça institucionalizada, os senhores dessa cristandade rejeitam e até matam agentes de pastoral, padres, bispos ... mas o povo, que era considerado incapaz de um cristianismo "decente", recebe com ânimo o convite de se constituir em comunidade de Cristo.

Do livro "Liturgia Dominical", de Johan Konings, SJ, Editora Vozes
(http://www.franciscanos.org.br/)

Tu me amas? - 3º Dom. Páscoa/2010

Somos conscientes de que a palavra de Deus anima os seguidores de Jesus, dá-nos coragem para enfrentar os obstáculos e nos convida a acolher o Cristo que se oferece em comunhão.

Na eucaristia deste Domingo, devemos responder à pergunta de Jesus: Vocês me amam? Reunidos em torno do Cordeiro imolado que ressuscitou, apresentamos nossa gratidão, pois ele nos alimenta com a palavra e com pão.

Com a presença do Ressuscitado, os discípulos retornam para a Galileia.

Existem opiniões de que este capítulo 21 do Evangelho de João seja um acréscimo tardio ao original. Contudo, não há pleno consenso sobre a questão. O capítulo daria continuidade ao Evangelho, agora com os discípulos retomando sua vida e sua missão, representada pela pescaria, na Galileia, com a presença do Ressuscitado.

O retorno dos discípulos para a Galileia, após a ressurreição de Jesus, é testemunhado pelos Evangelhos de Marcos, Mateus e João. Apenas Lucas é que, tanto no fim de seu Evangelho (Lc 24,49) como em Atos dos Apóstolos (At 1,3-4), menciona a permanência dos discípulos em Jerusalém.

Com isto Lucas, com a perspectiva paulina, pretende apresentar o movimento de Jesus como uma continuidade do Judaísmo, com o deslocamento de Jerusalém para Roma.

Esta narrativa de João aponta para algumas orientações das comunidades que começam a se estruturar em Igrejas. A presença do Ressuscitado fortalece a missão, tendo como fundamentos o serviço e a partilha eucarística (pão e peixe servidos pelo Ressuscitado).

Fica também confirmada a primazia de Pedro, que é incumbido de pastorear as ovelhas de Jesus, bem como o testemunho de sua fé (primeira leitura) até o martírio.

Prof. Diácono Miguel A. Teodoro
http://www.teologiafeevida.com.br/

Páscoa: nova criação - 2º Domingo Páscoa/2010

O segundo domingo pascal, domingo das "vestes brancas", acentua a nova existência do cristão regenerado pelo batismo (ou pela renovação do compromisso batismal).

Na 1ª leitura, início de uma série de leituras de At, esta novidade se manifesta na atuação da primeira comunidade cristã, suscitando admiração por causa de sua união e dos sinais que a acompanham. O novo povo de Deus cresce ligeiro. Com razão, o salmo responsorial comenta: a pedra rejeitada tornou-se pedra angular.

A 2ª leitura é a visão inicial do Apocalipse. No "primeiro dia da semana", dia da ressurreição e da assembléia cristã, ele vê o Cristo glorioso, o "primeiro e o último" (1,17), o "vivo que foi morto" (1,18) e que "tem as chaves da morte", ou seja, tem a morte em seu poder (1,8). É a aparição do Cristo como Senhor do Universo. Os tempos são nele resumidos e recapitulados. No fim do livro, ele se manifestará como o renovador do Universo.

A novidade da situação pascal aparece também no legado que o Ressuscitado deixa para sua Igreja: a paz, como dom e como missão.

A paz é dom escatológico por excelência, a renovação da harmonia com Deus, o perdão (evangelho). Esta nova realidade vem no Espírito, o Espírito do batismo, o Espírito de Cristo. Não é fruto do mero esforço nosso. É um dom dado a todos os verdadeiros fiéis, os que se confiam a Cristo e em Cristo se tornam homens novos; os que não são determinados por critérios biológicos e sociológicos, mas "nasceram de Deus" (Jo 1,12-13).

De modo especial, a liturgia de hoje se dirige aos recém-nascidos filhos de Deus (canto da entrada, oração do dia).

A esta novidade podemos dedicar uma consideração comunitária e histórica, como é sugerido especialmente pelas duas primeiras leituras. A comunidade cristã aparece, no mundo, como um mundo novo, escatológico (cf. os sinais).

As pessoas aderem a ela para "serem salvas" (na hora do Juízo). No Ap, Cristo aparece como o Senhor da História, o "Filho do Homem" daniélico (1,12).

Este Senhor da História foi morto. Sua morte aconteceu por causa de sua total solidariedade com a história humana, na qual ele se integrou, numa práxis autêntica, conscientizadora e libertadora, procurando restituir ao homem seu Deus, e a Deus, sua Lei e seu povo. Sua prática em prol da vida o levou ao testemunho radical da morte (cf. Ap 1,4: a Testemunha Fiel).

Ora, se este Senhor, que por nós e conosco enfrentou a rejeição e finalmente a morte, agora vive, então, a História, que ele assumiu, vive com ele. No Cristo pascal revive a História humana para uma vida nova, totalmente diferente, vencedora do antigo pecado, que em Cristo foi crucificado. Uma História que já pertence à não-História, ao fim dos tempos.

Pois "ele" é o primeiro dos homens, realizando a vocação original da humanidade, ou seja, a completa filiação divina; mas nisso ele é também o último, a plenitude.

Essa novidade da História humana deve transparecer na comunidade dos renovados pelo batismo. A renovação pascal não é apenas uma revigoração interior, nem apenas um retomar de algumas boas práticas e um provisório desistir de alguns vícios. Isso seriam apenas "variações sobre um tema antigo", como se diz na música. Temos de compor uma peça nova, tendo uma estrutura nova. E, mesmo se esta não for a melhor, o fato de ser nova e melhor que a anterior será um sinal de que escolhemos o lado daquele em quem nossa história antiga morreu, para ressuscitar na força de Deus.

Do livro "Liturgia Dominical", de Johan Konings, SJ, Editora Vozes
(www.franciscanos.org.br)